De 2005 a 2025: Uma análise do impacto da Lei do Bem na indústria brasileira

Com R$ 296 bilhões investidos em duas décadas, a Lei do Bem transformou o cenário da inovação no país. Uma análise baseada no livro comemorativo da ABES sobre o legado e o futuro do principal instrumento de fomento à P&D do Brasil.

Em 2025, o Brasil celebra um marco silencioso, mas profundamente transformador: os 20 anos da Lei nº 11.196, a Lei do Bem. Para marcar a data, a Associação Brasileira das Empresas de Software (ABES) lançou o livro “Lei do Bem: Duas Décadas de Fomento à Inovação no Brasil“, uma publicação que vai além da celebração e oferece uma análise robusta do impacto do instrumento. O número central, por si só, justifica a comemoração: entre 2006 e 2024, a lei ajudou a mobilizar impressionantes R$ 296 bilhões em investimentos em Pesquisa, Desenvolvimento e Inovação (PD&I). Contudo, como a própria publicação detalha, o legado dessas duas décadas transcende o capital financeiro, representando uma mudança estrutural na forma como a indústria brasileira encara a inovação.

O Despertar para a Inovação: A Consolidação de uma “Nova Mentalidade”

Um dos pontos centrais do livro da ABES, explorado em seu segundo capítulo, é a consolidação de uma “nova mentalidade” empresarial. Antes de 2005, a inovação era, para muitas empresas, um luxo ou um custo a ser minimizado. A Lei do Bem, ao oferecer um benefício fiscal direto e de fácil acesso, foi crucial para que o investimento em PD&I passasse a ser visto como uma decisão estratégica, essencial para a sobrevivência e o crescimento no longo prazo.

Mais do que isso, a lei democratizou o acesso à inovação. Se antes os grandes projetos de pesquisa estavam concentrados em poucas multinacionais ou estatais, a Lei do Bem permitiu que empresas de médio e até pequeno porte pudessem estruturar seus primeiros projetos de PD&I, plantar a semente da cultura inovadora e colher os frutos em forma de novos produtos, processos e serviços.

Para André Maieski, sócio da Macke Consultoria, a mudança cultural foi o maior legado da lei. “Os R$ 296 bilhões são a consequência, não a causa. A verdadeira transformação que testemunhamos, e que o livro da ABES documenta, foi a maturação da gestão da inovação. A Lei do Bem ensinou as empresas a organizarem suas ideias, a medirem seus resultados e a integrarem a P&D ao seu planejamento estratégico. Ela profissionalizou a inovação no Brasil.”

A Transformação Interna das Empresas: Mais do que Projetos, uma Nova Estrutura

O terceiro capítulo do livro da ABES, intitulado “Transformação das empresas”, aprofunda essa análise, mostrando que o impacto da Lei do Bem foi também interno. A necessidade de prestar contas ao governo para usufruir do benefício fiscal obrigou as empresas a se organizarem. Departamentos de P&D foram criados ou formalizados, a governança sobre os projetos de inovação foi aprimorada e a transparência sobre os investimentos aumentou.

Essa organização interna, que poderia ser vista como um mero fardo burocrático, revelou-se um ativo estratégico de valor inestimável. Ao se estruturarem para atender aos requisitos da Lei do Bem, as empresas se tornaram mais eficientes, mais ágeis e mais preparadas para competir em um cenário global que exige inovação contínua. Essa disciplina interna foi o campo de treinamento que preparou a indústria brasileira para os desafios atuais.

“A disciplina imposta pela Lei do Bem foi uma bênção disfarçada”, afirma Angelita Nepel, sócia da Macke Consultoria. “Ela forçou as empresas a documentar, a planejar e a justificar seus investimentos em inovação. Esse rigor preparou o terreno para o que vemos hoje com a Nova Indústria Brasil (NIB). As empresas que aprenderam a lição de casa com a Lei do Bem são as que agora conseguem navegar com mais facilidade nos editais do BNDES e da Finep, pois já falam a língua do fomento.”

O Amanhã Construído Hoje: O Legado para o Futuro da Indústria

O legado de duas décadas de investimentos contínuos é o alicerce sobre o qual o futuro da indústria brasileira está sendo construído, como sugere o quarto capítulo do livro, “O amanhã está sendo construído”. Os bilhões investidos em setores como Tecnologia da Informação, Energia, Saúde e Agronegócio criaram competências, tecnologias e capital humano que são cruciais para o Brasil enfrentar os desafios da descarbonização, da transformação digital e da bioeconomia.

Não é coincidência que as missões da Nova Indústria Brasil (NIB) estejam focadas exatamente nessas áreas. A experiência acumulada pelas empresas brasileiras com a Lei do Bem é, portanto, um ativo estratégico para o sucesso da NIB. As empresas não estão começando do zero; elas partem de uma base sólida de conhecimento e capacidade inovadora construída ao longo de 20 anos.

Brendo Ribas, sócio da Macke Consultoria, vê essa conexão como uma vantagem competitiva clara. “Uma empresa que utilizou a Lei do Bem nos últimos 10 anos para desenvolver soluções em eficiência energética, por exemplo, hoje tem uma expertise acumulada que a posiciona na vanguarda da missão de transição energética da NIB. O histórico de projetos aprovados pela Lei do Bem funciona como um selo de qualidade, um atestado de sua capacidade de inovar que é extremamente valioso ao pleitear recursos mais vultosos da NIB.” Ao olharmos para trás, para os 20 anos da Lei do Bem, vemos muito mais do que um incentivo fiscal bem-sucedido. Vemos a história da transformação da indústria brasileira, que aprendeu a inovar de forma sistemática e estratégica. Longe de se tornar obsoleta, a Lei do Bem se mostra mais relevante do que nunca, como a base sobre a qual o ambicioso projeto da Nova Indústria Brasil pode e deve ser construído.

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